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quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Impactos da tradição africana/guineense – Parte III: Ainda alguns aspectos que podem ser melhorados


Bem trabalhadas, as tradições poderão tornar a  sociedade e a convivência entre africanos/guineenses melhores. Mas, é preciso distinguir aquilo que é benéfico e que deve ser preservado, daquilo que põe em causa o bem-estar e a dignidade dos cidadãos.
Respondendo a algumas questões dos aspectos fundamentais para enriquecer este debatenomeadamente:
a) Sobre a questão da transmissão de doenças infecto-contagiosas (SIDA, etc.), é lógico que a poligamia contribui para a propagação dessas doenças, já que basta um dos elementos (o homem ou uma das mulheres) estar contaminado para que todos possam contrair a doença. Não é por acaso que uma elevada taxa dessas doenças infecto-contagiosas (SIDA, etc.) é registada nos países onde a poligamia vigora para a esmagadora maioria da população. A poligamia poderia não ter tanto impacto nas sociedades africanas/guineenses, caso houvesse uma baixa taxa de analfabetismo e um forte investimento na Educação, Saúde e combate à pobreza e outras formas de desigualdades sociais. Na Suazilândia (tal como na África do Sul, Moçambique, etc.), por exemplo, cerca de 70% dos habitantes vivem abaixo da linha de pobreza e verifica-se uma das maiores taxas de HIV-SIDA do mundo.
b) Em relação a implicação do princípio de “4 dona” da Constituição da República da Guiné-Bissau, afirmo que a crispação face aos mestiços é evidente na lei guineense (e em quase todo o mundo), que nega o acesso a postos de chefia no Governo a todos aqueles que não tenham quatro avós guineenses (CRGB, 1996: art.-63º; Kosta, 2007: 221, 712-718; Silva, 2010: 9, 221). Esta lei viola a Declaração Universal dos Direitos do Homem e o art.-24º da CRGB que consagra o princípio da igualdade. Também constitui um contra-senso num contexto em que muitos guineenses gozam de dupla nacionalidade e, cujos avós não possuem certidões de registo de nascimento. Na situação em que a Guiné-Bissau se encontra e no mundo actual em que vivemos, não faz sentido ter uma lei destas. Isto demonstra a falta de igualdade e tolerância que se vive num país multicultural, cujo povo deriva de uma grande diversidade étnica transversal aos seus longos séculos de história.
c) A desigualdade entre os homens e mulheres é também transparente, em especial, na tradição da Guiné-Bissau, que é um sistema que favorece os homens, marginalizando de forma brutal e progressiva as mulheres. Hoje na Guiné-Bissau contam-se no total mais de 120 Régulos/Chefes tradicionais de diferentes etnias, em mais de 30 grupos e mais de 100 subgrupos étnicos - e todos eles são homens. Tudo isso faz com que poucos guineenses saibam que tipo de tratamento devem dar às suas mulheres face à política de igualdade de género/sexual que se defende actualmente.
Como Sociólogo e Politicólogo acredito que, salvo raras excepções, a mulher tem um papel de subjugação e humilhação na cultura guineense, que deriva do cumprimento de normas tradicionais criadas há séculos e que continuam a legitimar o Poder patriarcal. E questiono, porque é que um homem com várias mulheres é admirado e uma mulher com um amante é desprezada tanto em público como pela sua família? Em jeito de moderação, a valorização de um povo tem de passar sempre pela valorização da mulher como fonte primária de conhecimento e desenvolvimento de uma nação. Este é um tema de interesse para todos os seres humanos, porque todos têm ligação incontornável com uma mulher ao longo da sua vida (mãe, irmã, esposa, tia, etc.). Por outras palavras não faz sentido ter um mundo onde o filho tem mais direitos do que a sua mãe, de quem, aliás, porventura, herdou as suas melhores qualidades (Astelarra, 2005: 57-58; Cardoso, 2010: 24; Djaló, 2012: 93-97; Ferreira, V., 2000: 17; Keane, 2009: 561; Mendes, 2010: 58, 84, 96; Santos, 2003: 45-48, 126).
d) Ligado ainda à tradição guineense, posso referir, por um lado, as elevadas despesas de cerimónias em homenagens aos espíritos, baseadas em crenças tradicionais. Refiro-me às grandes despesas efectuadas com cerimónias como o “toca choro”, pelos familiares, em particular os filhos de uma pessoa que faleceu. Por outro lado, o Régulo manjaco para ser entronizado deve levar muitas cabeças de gado bovino ao chefe dos chefes em Baceâral. Antigamente, para este acto, o Régulo deveria levar 150 cabeças de gado bovino (Touros/Vacas) até Baceâral (Djaló, 2012: 94-95; Kosta, 2007: 161-218, 254-276; Mendes, 2010: 85). São apenas dois exemplos de como se gastam fortunas que poderiam ser investidas em Alimentação, Educação e Saúde, e que abre grandes vagas de pobreza para os guineenses. Ou seja: se os mesmos bens despendidos nos actos das cerimónias fossem investidos na saúde da vítima durante o tempo de vida, talvez a tivessem salvado e a sua vida teria mais utilidade para família e para sociedade em geral (Mendes, 2010: 85; Nóbrega, 2003: 62-66).
Portanto, se para um bom entendedor meia palavra basta, fica de pé a dúvida se um homem com muitas mulheres trabalha, e se consegue satisfazê-las todas ou admite implicitamente que elas se envolvem com outros homens (uma vez que deposita mais confiança no filho da sua irmã para sucedê-lo no Trono/Poder), entre muitas outras questões…E resta saber: se Amílcar Cabral fosse vivo, teria ou não imensos problemas com os seus pseudo-seguidores, defensores, porta-vozes  «os [Neo]cabralistas» - em relação ao que estes dizem de/sobre ele e propõem para África/Guiné-Bissau? Deixarei estes assuntos para os próximos posts, onde apresentarei também algumas propostas de mudança, lembrando aos caríssimos leitores para prepararem os seus escudos, porque vou atacar em diagonal e em profundidade (até 20 de Janeiro), com conjecturas e refutações das teses e contra-teses do [sobre o] assassinato de Cabral.

 Para mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador – Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (pp. 245-246; 250-252; 256; 265). Lisboa: Chiado Editora.

A todos os leitores desejo continuação de boas leituras e uma excelente entrada em 2016!

1 comentário:

  1. O Encontro com um Rei

    “Os povos têm costumes diferentes”.

    Lembro-me de um homem que conheci na capital da Guiné Bissau. Ele era natural da Ilha de Pecixe. Possuía trinta e três esposas, fora as amantes. Naquele país o poder de um homem é medido pelo número de esposas que possui. Em 1987 quando morava em Bafatá tomei uma decisão de entrevistar aquele homem.
    Peguei meu gravador. Fui procurá-lo, precisava registrar os detalhes.

    http://www.overmundo.com.br/banco/o-encontro-com-um-rei

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