Na maioria dos posts, existem hiperligações, de cor azul escuro, nas quais basta clicar para ter acesso às notícias, outros posts etc.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A descoberta de Cabo Verde e o surgimento dos “caboverdianos”


Guineenses, parem de stressar com “as ideias” e “os factos” mal contados. Como Sociólogo-Politicólogo africano/guineense cabe-me atacar em diagonal para descodificar os possíveis “embustes”. Começo por falar no surgimento de Cabo Verde e, nos próximos posts falarei das origens do crioulo e da relação de Cabo Verde com África.
Embora eu tenha estudado em Portugalnão faço parte daqueles africanos/guineenses que passam toda a sua vida nas Universidades estrangeiras (europeias) – «licenciatura, mestrado, doutoramento, etc.», – sem terem estudado a realidade do seu continente/país. Caros leitores, peço aos interessados em conhecer a história da chegada dos vários povos à actual Guiné-Bissau, que leiam por favor as páginas 101-117 do meu livro. E peçam aos outros guineenses formados para fazerem a sua parte, tal como estou a tentar fazer a minha.
No que toca ao surgimento dos caboverdianos, e face ao contexto histórico dos Estados africanos, verifica-se alguma falta de clareza nas suas relações. Quando olho para a Guiné-Bissau e para Cabo Verde, apercebo-me que estes dois países/povos da África Ocidental têm raízes submersas, que não permitem uma clara compreensão dos factos e ideias comuns entre guineenses e caboverdianos.
descoberta oficial de Cabo Verde ocorreu no século XV (1455/56), mas a sua autoria, constitui um enigma, sendo atribuída a diferentes personalidades: Alvise da Mosto “Cadamosto”, Vicente Dias, Diogo Gomes e António Noli. Cabo Verde era, no momento da descoberta do arquipélago, o nome do actual Senegal, por estar na ponta de África e ser um cabo ou pedaço de terra bastante verde que entra pelo mar (daí terem-lhe dado o nome de Cap Vert ou Cabo Verde). Ao avançar um pouco mais no mar, os marinheiros encontraram um conjunto de ilhas que, por estarem perto do “Cabo Verde”, receberam o mesmo nome. A ilha que foi descoberta no mês de Maio recebeu o nome de ilha de Maio; a que foi descoberta no dia de S. Tiago foi ilha de S. Tiago; a que tinha o terreno com muito sal ficou ilha do Sal; a outra por ser bonita de longe passou a ser a ilha da Boa Vista, etc. Parte-se, supostamente, do princípio de que não vivia ninguém no arquipélago de Cabo Verde quando os portugueses lá chegaram, no entanto, existe a hipótese de que estas ilhas já teriam sido ocupadas por habitantes da Costa de África, em especial Manjacos (da Guiné-Bissau) e Lebus/“Lebuns” (pescadores da Costa do Senegal). A verdade é que, quando os portugueses encontraram as ilhas de Cabo Verde, disseram que estas estavam desabitadas e começaram a ser utilizadas como ponto de apoio ao comércio triangular[1]: os seus habitantes actuais são, sobretudo, descendentes dos escravos vindos da actual Guiné-Bissau (Cabral, 2008: 129-131; Djaló, 2012: 139-149; Lara, 2000: 67; Lopes, 1982: 20; 1999: 33-34; Mendes, 2010: 18-19).
Outro dos factores associados com a origem de Cabo Verde foi a necessidade de criar um Sistema de Segurança Geoestratégica dos Portugueses face a algumas revoltas na sub-região africana, em particular, na própria Guiné. Portugal precisava de um espaço seguro para se proteger e armazenar os seus escravos, e Cabo Verde oferecia-lhe essas condições. O facto de ser um território no meio do Oceano Atlântico oferece uma enorme segurança e tranquilidade.
O facto de os guineenses estarem na origem dos primeiros habitantes de Cabo Verde é um indicador que nos ajuda a perceber a razão pela qual, ao longo dos séculos, os dois países foram governados, muitas vezes, pelos mesmos Governadores com residência na Praia, em Cabo Verde. Este aspecto relaciona-se também com o facto de a Guiné-Bissau e Cabo Verde serem os dois países da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP) onde a língua crioula é a mais falada e utilizada. Presume-se que o crioulo tenha sido desenvolvido pelo contacto entre os portugueses e povos do Golfo da Guiné (principalmente as etnias Mandinga e Fula), ainda antes da chegada “oficial” de Portugal ao território da actual Guiné-Bissau, sendo depois levado para as ilhas de Cabo Verde pelos escravos guineenses. Todos os dados indicam que foram os escravos guineenses que deram origem à atual população de Cabo Verde e, por consequência, ao crioulo que hoje é uma das línguas oficiais do arquipélago, a par da língua portuguesa. Mais tarde, o crioulo terá sido transportado para S. Tomé e Príncipe por colonos portugueses que usavam trabalhadores caboverdianos como quadros administrativos para as outras colónias (Cabral, 2008: 127-131; Cardoso, 1989: 52; Bull, 1989: 57; Kosta, 2007: 187; Lara, 2000: 101; Lopes, 1982: 20, 63, 87-88; 2005: 26; Mendes, 2010: 19-20).
Caríssimos leitores, no próximo post, irei abordar o tema do surgimento dos crioulos da Guiné-Bissau e de Cabo Verde.
Para mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador - Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (pp. 104-116, 169). Lisboa: Chiado Editora.



[1] Chama-se comércio triangular devido ao percurso que os traficantes de escravos faziam da Europa para África e desta para a América, regressando de novo para a Europa (o percurso era em forma de um triângulo, daí advém o seu nome de comércio triangular); mas também pode ser chamado de tráfico negreiro, tendo em conta que eram os negros ou africanos que eram traficados ao longo destas rotas (Kosta, 2007: 218; Lara, 2000: 39).

Sem comentários:

Enviar um comentário