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segunda-feira, 4 de março de 2019

Max Weber Está Triste Com Os Partidos Políticos Guineenses


Prezados leitores, desejo-vos um bom carnaval. Também faço votos para que a campanha eleitoral corra com normalidade. Meus amigos, improvisei esta pequena síntese da actualidade com base da análise de Max Weber em relação aos Partidos Políticos, apesar de estas ideias terem sido proferidas numa palestra em 1918/19 – há um século. Aconselho os meus queridos leitores que leiam o post de hoje, em primeiro lugar, em articulação com o post «Max Weber em 3 minutos para os politiqueiros guineenses»; em segundo lugar, deve ser articulado também com o post «A anulação da expulsão dos 15 deputados do PAIGC e a ética Weberiana»; em terceiro lugar, pode ser articulado ainda com o post «Sobre a relação entre os interesses dos politiqueiros [1] guineenses com a realpolitik».
Como vos disse, numa Conferência pronunciada no Inverno de 1918/1919, o intelectual alemão Max Weber «1864-1920», descreveu, em síntese, as principais características dos Partidos Políticos, que se enquadram, em especial, nas actuais características dos Partidos da Guiné-Bissau.
Perante a constatação de que muitos políticos apenas utilizam a política como um meio para obter benefícios, Weber traça um retrato da situação no que diz respeito aos Partidos Políticos. Weber refere que, naquela época (no final da década de 1910), as lutas entre Partidos Políticos visavam sobretudo o controlo da distribuição/repartição de cargos/tachos, chamando os Partidos Políticos de verdadeiras “manjedouras/comedouras estatais” (ou seja, o local onde os animais comem). Os Partidos Políticos transformaram-se, para os seus seguidores, em meios de realizar o fim de alcançar um cargo/tacho, sendo que, muitas vezes, os funcionários estão mal preparados para o cargo que ocupam, funcionando como “representantes da política do Governo” (Weber, 2005: 63, 73-76).
Max Weber diz-nos que o político deve lutar com paixão e basear-se na auto-responsabilização, assumindo a política como uma vocação pessoal. Pelo contrário, o funcionário não deve fazer política, mas administrar de modo não partidário. Quando os funcionários ocupam cargos dirigentes, estamos perante “Governos de funcionários”, eticamente detestáveis e irresponsáveis – no sentido político do termo são maus políticos (Cardoso, 2010:19; Cícero, 2013: 15; Weber, 2005: 81-82).
Em todas as associações medianamente extensas, a função política é uma função de interessados, restrita a um pequeno número de pessoas activas, que se opõem aos elementos passivos. Os Partidos Políticos recorrem à liderança e militância como elementos activos do recrutamento livre, procurando mobilizar o eleitorado passivo para a eleição do líder (chefe). Neste sentido, os políticos profissionais tentam conquistar o Poder «através do prosaico e “pacífico” recrutamento de Partido no mercado eleitoral». No passado, a política era sobretudo uma profissão secundária, resumindo-se os políticos profissionais a um pequeno número de pessoas. Com a Democracia, surgiu o direito das massas ao sufrágio, e as organizações de massas, acabando com a dominação dos notáveis e o Governo dos parlamentares. A empresa política ficou nas mãos de “profissionais” a tempo inteiro, funcionários com salário fixo que se encontram fora do Parlamento. O Poder encontra-se nas mãos dos que realizam continuamente o trabalho dentro da “máquina” dos Partidos, sendo o líder/chefe aquele que é seguido pela máquina, passando por cima do Parlamento, e instaurando uma Democracia plebiscitária. Os militantes esperam que o efeito demagógico da personalidade do chefe conquiste votos e mandatos na fase eleitoral, dando-lhes Poder e aumentando o seu acesso a retribuições pessoais em cargos e outras vantagens (Weber, 2005: 82-89).
Dentro dos Partidos, existe, com frequência, tensão entre os “funcionários” e alguns “notáveis” influentes, com “experiência partidária”. Estes notáveis são facilmente seguidos pelo eleitor pequeno-burguês e rural, que apoia e lhe é mais conhecido e familiar. Na Inglaterra, até 1868, a organização dos Partidos era quase unicamente constituída por notáveis. A partir dessa data, com a democratização do voto, tornou-se necessário criar um enorme aparelho de associações aparentemente democráticas, numa rede profundamente burocratizada, onde, rapidamente, se enquadra 10% do eleitorado. Os Partidos alimentam assim um aparelho de pessoal considerável, abarcando centenas de pessoas, que vivem directamente “da” política dos Partidos, sem contar com os inúmeros colaboradores interessados ou caçadores de cargos. Quando existe um líder forte, esta máquina disciplinada mantém-se «no país, quase sem consciência própria e inteiramente nas mãos do chefe. Por cima do Parlamento está, pois, o ditador plebiscitário que, por meio da máquina, arrasta atrás de si a massa e para o qual os parlamentares são apenas prebendados políticos inseridos no seu séquito/comitiva». Nestas condições, o líder deve ter, além de vontade, o Poder do discurso demagógico, que lhe permitirá criar uma ditadura baseada na emotividade das massas (Marina, 2009: 82-83; Weber, 2005: 93-95).
Nos EUA, a “máquina plebiscitária” cresceu também rapidamente, substituindo a inicial administração dos gentleman por máquinas partidárias fortíssimas. O facto de o chefe do Poder executivo, e patrono que dispõe de todos os cargos, ser um presidente eleito por plebiscito, faz com que actue com total independência face ao parlamento, na distribuição de vantagens e cargos. Em suma, os Partidos são organizações desprovidas de convicções, moldadas pelas lutas eleitorais mais relevantes para a distribuição dos cargos. Isto remete-nos para a política realista de Maquiavel que, nos seus conselhos ao príncipe, defende a estratégia “os fins justificam os meios”, devendo o líder adaptar-se de acordo com o vento – neste caso falamos de Partidos mas a lógica parece ser a mesma. Nos EUA, por detrás desta máquina partidária estão os bosses, que, na sombra, angariam votos e financiamentos, e determinam o jogo do Poder (Weber, 1979: 63-66; 2005: 95-96, 99-100).
Em jeito de conclusão, recordo os meus leitores que tenho defendido a despartidarização e despolitização do sector privado e da administração pública guineenses, ou seja, é necessário terminar com acumulações de cargos. A este propósito, recordo a classificação de Fernandes (2010: 107-118), que distingue entre funções políticas e funções técnicas. As funções políticas incluem a função governativa e a função legislativa. As funções técnicas incluem a função administrativa e a função jurisdicional (Mendes, 2015: 298-302). Portanto, é urgente evitar as nomeações políticas nas áreas que dizem respeito às funções técnicas, que devem ser ocupadas por concursos públicos & ou por carreira profissional.
Afinal quem é que beneficia com as nossas eleições[2]?


[1] Politiqueiro designa alguém que recorre a intriga para conseguir o Poder ou Cargos Públicos.
[2] defeito do sistema eleitoral da representação proporcional segundo o método de Hondt dá-nos a entender que o sistema eleitoral guineense é, no fundo, um sistema de endividamento e de estagnação do país. Por estas razões concordo com a preocupação do Prof. Doutor Kafft Kosta, na medida em que quem ganha com este endividamento é o credor (comunidade internacional) e quem perde é o devedor (Guiné-Bissau). Ou seja: «não há dinheiro e andamos a fazer todos os esforços para a angariação dos recursos necessários para a realização das eleições presidenciais de 5 em 5 anos e legislativas de 4 em 4 anos (e/ou com quedas constantes de Governos) na data marcada; solicitamos à comunidade internacional que disponibilize os recursos (financeiros, materiais e humanos) necessários», sabendo que «os países doadores se envolvem nestes gestos de modo a obterem mais-valias para os seus bolsos». Ou melhor, a comunidade internacional «actua, às vezes, sob capa de cooperante, fazendo lembrar aqueles bombeiros que apagam o fogo com gasolina» (Kosta, 2007: 277-281, 467, 654).

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