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sexta-feira, 29 de abril de 2016

Propostas, manobras e atitudes de Miguel Trovoada na Guiné-Bissau

Caros leitores, no post de hoje trago-vos uma análise da actuação de Miguel Trovoada, representante das Nações Unidas «NU» para a Guiné-Bissau, em Três Dimensões «3D»: Factos; Conjecturas; e Refutações. Tenho sérias dúvidas que as figuras "independentes" encontradas por Miguel Trovoada e seus colaboradores sejam realmente independentes. Espero que estas iniciativas não sejam "pior emenda que o soneto" (ou seja, que a solução venha a piorar ainda mais o problema que já tínhamos em mãos).

Primeiro facto: Sob proposta de Miguel Trovoada, realizou-se a 27 e 28 de Abril de 2016 um fórum de debate e reflexão que incluiu «instituições de Estado, partidos políticos, sociedade civil, forças religiosas e toda a gente para falar das causas da instabilidade e das grandes vantagens que adviriam para o país se de facto contasse com uma plataforma que garantisse a estabilidade». Na sequência deste encontro, as NU manifestaram a necessidade de as lideranças da Guiné-Bissau, através de três personalidades independentes e de reconhecido mérito, prepararem um pacto de estabilidade no prazo de um mês, para ser assinado num acto público por todas as instituições e elementos da sociedade civil que nele se revejam. O encerramento das jornadas serviu para Miguel Trovoada se despedir dos guineenses, já que termina na sexta-feira a sua missão como representante do secretário-geral das Nações Unidas na Guiné-Bissau (Rádio ONU, 15-04-2016; RTP África, 27/28-04-2016; Sapo Notícias, 28-04-2016).
Segundo facto: As NU inauguraram o quarto escritório regional na ilha de Bubaque, para «promover o combate ao crime transnacional no arquipélago dos Bijagós». O escritório vai acolher pessoal do Gabinete Integrado das Nações Unidas para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau «UNIOGBIS» e outras agências das NU, dando condições técnicas para uma presença mais activa no arquipélago guineense (A Bola, 22-04-2016).
Terceiro facto: O Governo da Guiné-Bissau e as NU assinam uma parceria de 302 milhões de euros (343 milhões de dólares) de apoios ao país até 2020. Uma fatia de 28% do financiamento está garantida através do sistema das NU, enquanto 72% ainda tem de ser mobilizado (Sapo Notícias, 28-04-2016). Resta saber quais são as condições para a mobilização da maior parte do financiamento, porque, muitas vezes, acaba por nunca chegar ao destino.
Quarto facto: Miguel Trovoada recomendou ao Presidente da República «PR» guineense, José Mário Vaz «Jomav», para que não seja árbitro e jogador ao mesmo tempo, referindo que "ser presidente não é uma tarefa fácil. Como chefe da Nação, o senhor tem o papel de árbitro, o árbitro é aquele que está equidistante em relação às equipas que estão a jogar, é aquele que é o garante da aplicação das regras do jogo". Miguel Trovoada despediu-se esta quinta-feira, 28 de Abril de 2016, do PR Jomav, após 20 meses de missão na Guiné-Bissau (A Semana, 29-04-2016).
Bem analisados, estes actos do representante das NU revelam uma preocupação que vai de braço dado com a filosofia política da ala pró-Domingos Simões Pereira «DSP», como eu já tinha referido anteriormente. Mas por detrás da sua preocupação avista-se uma grande suspeita, que me leva a fazer algumas conjecturas.
Primeira conjectura: se eu olhar para o slogan que diz “é melhor tarde que nunca”, questiono a razão pela qual Miguel Trovoada não apresentou uma proposta deste género durante esta longa instabilidade política em que a Guiné-Bissau se encontra mergulhada. Esperava que Miguel Trovoada não convidasse para esse debate de ideias os mesmos protagonistas de sempre, mas infelizmente acabou por convidá-los na mesma. Segunda conjectura: se a proposta de Miguel Trovoada for interpretada como “uma manobra dilatória” cuja intenção é de distrair/adiar a decisão do PR Jomav de derrubar o Governo (para que a ala pró-DSP possa ganhar tempo), então isso poderá levar a ala pró-Jomav a acelerar a queda do Governo de Carlos Correia através da pressão dos 15 Deputados, PRS e alguns veteranos de guerra sobre o PR Jomav. Parece, contudo, que DSP e Carlos Correia não estão a conseguir aproveitar bem esta oportunidade. Terceira conjectura: os gestos finais de Miguel Trovoada podem ser interpretados como manobras da sua realpolitik para conseguir renovar o seu contrato com as NU por mais um ou dois mandatos na Guiné-Bissau. O anúncio do apoio financeiro e material das NU à Guiné-Bissau nesta altura do campeonato constitui uma forte evidência desta conjectura. Toda esta atitude de Miguel Trovoada só poderia acontecer em África, em particular na Guiné-Bissau, onde o protagonismo de um representante como este é equiparado ao Poder de um Chefe de Estado, devido ao excesso de dependência e à incompetência dos governantes africanos/guineenses.
Primeira refutação: Miguel Trovoada não é pessoa indicada para dar à Guiné-Bissau e aos guineenses lições de moral. Porque quem quer fazer este papel deve reunir os requisitos de um governante exemplar (tal como fez o sul-africano Nelson Mandela). Isto porque a proposta do representante das NU revela muitos paradoxos face ao cargo de PR que Miguel Trovoada já desempenhou em S. Tomé e Príncipe. Sabendo que Miguel Trovoada fez dois mandatos como PR num país (de 1991 a 2001) onde nenhum Governo eleito cumpriu o seu mandato da forma prevista na Constituição (tal como na Guiné-Bissau, onde nenhum dos 18 Governos eleitos cumpriu o seu mandato), porque razão Miguel Trovoada não optou por um fórum desta natureza no seu país?
Segunda refutação: Não faz sentido nenhum que Miguel Trovoada faça constantemente avisos apenas ao PR. Será que os outros órgãos de Poder também não precisam de ser aconselhados e avisados? O que justifica esta parcialidade por parte de uma figura que deveria ser completamente imparcial?
Terceira refutação: Miguel Trovoada deve esclarecer se existiram ou não insultos e humilhações entre ele e os Primeiros-Ministros «PM» que governaram em S. Tomé e Príncipe durante os seus mandatos, tal como agora está a decorrer entre o PR Jomav e o PM Carlos Correia (e também com o ex-PM DSP)? E qual seria a sua posição caso lhe acontecesse o mesmo que Jomav está enfrentar? Porque durante o exercício das suas funções Miguel Trovoada, ao contrário do que agora defende relativamente a Jomav, desempenhou o papel de árbitro, jogador, treinador, chefe de claque, e até de massagista…
Para concluir, deixo um importante aviso: Miguel Trovoada parece ter conseguido “adormecer” as autoridades político-militares guineenses, aproveitando, com as suas “ajudas”, para instalar mais uma base nos Bijagós. As forças militares guineenses devem estar atentas à realização de manobras militares conjuntas entre Cabo Verde e os EUA, em conjugação com a criação desta nova base (A Semana, 28-04-2016; Sapo Notícias, 15-04-2016). Estas manobras (tanto militares como de Miguel Trovoada) à margem do território guineense serão com certeza do agrado daqueles que defendem a transformação da Guiné-Bissau num protectorado das NU. É importante questionarmos: é a Guiné-Bissau que supervisiona as NU no seu território ou são as NU que têm controlo do território guineense?

Para mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador - Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau. Lisboa: Chiado Editora.

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