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sábado, 1 de setembro de 2018

Das Crises Internas na Política dos EUA ao Bipartidarismo/Bipolarização do Sistema Político Americano


Caros leitores, mais uma vez sejam bem-vindos. Este post serve de enquadramento para a minha análise das Crises Internas do PAIGC que pretendo analisar na próxima publicação deste blogue. Assim, tentarei estabelecer uma ponte entre as crises internas na política dos EUA que levaram ao Bipartidarismo/Bipolarização do Sistema Político Norte-Americano e a situação Guineense. Apresentarei uma proposta de mudança com base nos pressupostos aqui apresentados. Peço-vos que leiam com muita atenção para poderem estar preparados para o meu próximo post.



Após a sua Independência face à Reino Unido/Inglaterra, os EUA não se tornaram automaticamente um Estado/País Unificado – tratava-se de uma Confederação de 13 Estados que tinham em vista a sua Independência, uns face aos outros (bastante semelhante àquilo que é hoje a União Europeia). Não existia nenhum Presidente e o Congresso servia apenas para resolver questões pontuais que fossem do interesse da Confederação. No entanto, quando a Crise Económica se acentuou, começaram a levantar-se vozes a favor de uma União (Migowski, 2017).
Face aos problemas sentidos, George Washington convocou uma Convenção para criar uma Constituição – nesta Convenção estavam, de um lado, os Federalistas (como George Washington, Benjamin Franklin, James Madison e Alexander Hamilton), que defendiam a criação de um Poder Central mais Estruturado que defendesse os Cidadãos dos Abusos de Poder; do outro lado, estavam os Anti-Federalistas (como Samuel Adams, Richard Henry e, mais tarde, Thomas Jefferson), que se opunham à criação dos Estados Unidos e defendiam a Liberdade e Independência dos Estados, com receio de vir a enfrentar uma nova Tirania. Os Anti-Federalistas desconfiavam quer da Centralização Governamental quer da Acumulação sem limites da Riqueza Privada à custa de um Mercado também sem limites, por que temiam que o Governo e o Mercado, uma vez aliados, acabassem por destruir os Fundamentos da República (Keane, 2009: 290, 306-311).
Estas Duas Facções deram origem, mais tarde ao Bipartidarismo ‘Bipolarizado’ Americano. Os Federalistas venceram e os EUA foram criados, com Duas Câmaras que garantiam a Representação dos Estados, sem eliminar as suas diferenças: a Câmara dos Representantes seria proporcional à População dos Estados e a Câmara do Senado seria formada por Dois Membros de cada Estado, indicados pelos Deputados. As divisões entre Federalistas e Anti-Federalistas estendiam-se ao Campo Económico – os Federalistas defendiam um ‘Modelo mais Industrial’, baseado no investimento em Obras Públicas e Infraestruturas, enquanto os Anti-Federalistas pretendiam um ‘Modelo mais Liberal’, assente no Agronegócio e no Trabalho de Escravo. “O Choque entre Hamilton e Jefferson (…) simbolizou não apenas questões que preocupavam Americanos na Primeira República, mas as divisões de longo prazo que a Nação precisou sanear no século XIX: entre Aristocracia e Democracia, Industrialização e Agrarianismo, e Poder Centralizado e Direito dos Estados. Todas tinham potencial para dividir a Nação que acabara de ser Unificada” (Susan Grant, citada por Migowski, 2017; Keane, 2009: 307).
A Política Partidária Americana consolidou-se neste embate em 1795, depois de se ter criado o cargo de Presidente através da Constituição, realizaram-se as Primeiras Eleições. Venceu John Adams, candidato Federalista, apoiado por Alexander Hamilton. Thomas Jefferson, que se candidatou pelo Partido Republicano-Democrata, que tinha sido fundado [nos inícios da década de 1790] para disputar as Eleições perdeu, mas o seu Modelo Económico não foi perdido. Os EUA passaram a implementar o Modelo de Alexander Hamilton [Modelo mais Industrial] no seu País, mas o Modelo de Thomas Jefferson [Modelo mais Liberal] em outros Países, usufruindo assim dos benefícios que o Livre Comércio tinha em quintal alheio – estavam a concretizar, assim, a ideia de “fazer como os Ingleses fizeram” (Keane, 2009: 307-310; Migowski, 2017).
Em 1800, Thomas Jefferson acabou mesmo por se tornar Presidente, após um empate contra Aaron Burr, que foi resolvido pela Câmara dos Representantes e pelo apoio explícito/claro de Alexander Hamilton[1], que influenciou a última votação da Câmara a favor de Thomas Jefferson. De uma forma surpreendente, os EUA resolveram este Impasse Político de forma exemplar e pacífica, deixando o Mundo admirado e abrindo espaço para uma Democracia onde se respeitassem sempre os resultados eleitorais (Keane, 2009: 306-311; Migowski, 2017).
Os Partidos Políticos hoje existentes resultam das Constantes Polarizações desde a Independência. O facto de ser um País de Imigrantes, implicava que nenhum grupo tinha Poder para implementar a sua agenda, o que poderia levar a fragmentações, se não houvesse esta aglutinação em Dois Grandes Blocos. Assim, as diferenças Étnicas, Culturais e Raciais foram aos poucos perdendo espaço diante da Crescente Polarização. Com a União, os Federalistas e os Republicanos-Democratas (nascidos nas Primeiras Eleições), acabaram por se dissolver, sendo substituídos por Duas Novas Forças: os Democratas (herdeiros de Thomas Jefferson, mais próximos dos Esclavagismos Sulistas e dos Anti-Federalistas) e os Whigs (herdeiros de Alexander Hamilton, mais próximos dos Antigos Federalistas, dos Industriais do Norte e das Ideias Abolicionistas). Em 1854[2], com as ideias do Fim da Escravidão, do Governo Forte e da Intervenção Económica, os Whigs mudaram o seu nome para Partido Republicano (Keane, 2009: 306-311; Migowski, 2017).
Surpreendentemente, podemos concluir que:
“Os Republicanos, portanto, eram herdeiros de Alexander Hamilton e defendiam a Industrialização e a Intervenção do Estado na Economia. Como podemos perceber, a Divisão Ideológica no século XIX era bem diferente da atual. O Partido Democrata (herdeiros de Thomas Jefferson), por outro lado, tinha as suas Bases Eleitorais no Sul e sua Plataforma Política era a Defesa da Economia Agrária, da Escravidão e do Livre-Comércio.” A Abolição da Escravatura constitui um marco na perda da Identidade dos Democratas. Os Republicanos, por sua vez, aproveitaram o avanço da Industrialização para se aproximarem do Liberalismo Político e das Ideias de Thomas Jefferson, usadas para justificar o Imperialismo Americano. Isto acabou por levar Antigos Conservadores Esclavagistas a ingressar no Partido Republicano, abrindo espaço para Lideranças mais Progressistas dentro dos Democratas. A Crise de 1929 consolidou a Posição Ideológica actual dos dois Partidos – Democratas & Republicanos – nos EUA (Keane, 2009: 291-389; Migowski, 2017).
O mais importante neste Duelo foi o que marcou para sempre as Crises que se seguiram nos EUA. Ficou famoso, em primeiro lugar, o juramento de Thomas Jefferson que, em Público, insistia dizer que não era nem Federalista nem Anti-Federalista. E no entanto, ele e o seu amigo James Madison trataram (em 1790) de Conquistar o apoio dos jornais para as suas Posições Políticas. Era uma jogada arrojada que ia de encontro ao Consenso Dominante e era também um passo gigante no sentido da Institucionalização de uma vida Política feita de Partidos, tal a conhecemos. Em segundo lugar, foi o Discurso Inaugural de Thomas Jefferson em 1801 como Presidente recém-eleito, em que disse: «venho pedir a vossa indulgência para os meus próprios erros, os quais jamais serão intencionais, e o vosso apoio contra os erros dos outros […]; conquanto a vontade da maioria deva prevalecer em todos os casos […] a minoria é titular dos mesmos direitos, que uma mesma lei deverá proteger». No fim afiançou que «todos nós somos Republicanos, todos nós somos Federalistas». Em terceiro lugar, em toda a História da Democracia Representativa, esta foi pela Primeira Vez em que se viu passar o Poder Governamental de um Partido Eleito para outro Partido também Eleito sem que houvesse, além disso, qualquer sublevação violenta (Keane, 2009: 307, 310).
 Espero que os leitores tenham ficado mais esclarecidos sobre este episódio da História dos EUA. Podemos aproveitar este exemplo para analisar a nossa própria realidade e fazer propostas. Por aqui se pode verificar que muitas crises podem ter um lado positivo, se forem bem aproveitadas.


[1] Infelizmente, Aaron Burr nunca perdoou Alexander Hamilton por esta tomada de posição que considerou uma facada nas costas, acabando mesmo por matar Hamilton num Duelo provado, três anos mais tarde (Keane, 2009: 309). Tomara que este Duelo não venha repetir-se na Guiné-Bissau entre as Duas Alas de que irei falar-vos.

[2] Daí darmos ‘alguma’ razão a Maurice Duverger quando afirma: «de facto, os Verdadeiros Partidos datam de apenas há dois séculos. Em 1850 nenhum País do Mundo, com a excepção dos EUA, conhecia os Partidos Políticos no sentido moderno da palavra. Havia Tendências de Opiniões, Clubes Particulares, Associações de Pensamento, Grupos Parlamentares, mas não Partidos Políticos propriamente ditos». Ainda de acordo com Duverger, «o desenvolvimento dos Partidos Políticos aparece ligado ao desenvolvimento da Democracia, isto é, à extensão do Sufrágio Popular e das Prerrogativas Parlamentares» [favorecidos supostamente pelo surgimento/funcionamento da Sociologia] (Duverger, 1970, citado por Fernandes, 2010: 188; 2004: 110-114; Mendes, 2015: 360).

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