Prezados leitores, no
post de hoje debruço-me apenas sobre dois
temas: o apuramento da selecção
nacional guineense «djurtus» para o Campeonato Africano das Nações «CAN»,
em relação com a importância de investir
no desporto (primeira parte); e uma reflexão
sobre as ajudas internacionais, a partir do donativo recebido recentemente dos EUA para as cantinas escolares.
Primeira parte. A selecção nacional da
Guiné-Bissau conseguiu, pela primeira
vez na sua história, desde a independência, o apuramento para o CAN. Trata-se de uma grande vitória, que deve ser fortemente
elogiada (O Jogo, 05-06-2016).
A propósito disto, retomo algumas ideias sobre a importância do desporto. Do
meu ponto de vista, é importante investir fortemente no desenvolvimento do
desporto, em paralelo com as outras áreas. O desporto é um instrumento de coesão social e a concorrência para a liderança dos clubes pode reduzir o
grande conflito para alcançar cargos políticos. Olhamos para o Ocidente, onde
esta área constitui fonte de afirmação
(Poder, dinheiro, reconhecimento, etc.), e verificamos que há pessoas que
preferem ser presidentes de um clube de
futebol ou um grande futebolista/desportista
do que ser membros do governo. A mesma lógica se aplica a outras áreas, como, por exemplo, ser empresário, autarca,
agricultor, artista, e, na melhor das hipóteses, ir para a Universidade. Há
quem prefira ser académico ou universitário, ser reitor, investigador,
conselheiro, assessor, gozar de sabedoria, respeito, Poder, do que ter uma
tarefa política ou desportiva etc. No fundo, devemos valorizar os méritos de cada um, com base na diversificação das escolhas disponíveis (Mendes, 2010: 95).
Segunda parte. Chegaram ao porto de
Bissau 4 mil toneladas de arroz para
a alimentação escolar doados pelo Ministério da Agricultura dos EUA através do Programa Mundial de Alimentos «PAM». Este donativo permitirá
assegurar refeições quentes para 173 mil
crianças em mil escolas do país,
pretendendo-se também o incentivo às
famílias para que as meninas da 4ª à 6ª classe frequentem mais de 80% das
aulas, lutando assim contra o abandono
escolar. Dentro de alguns dias chegarão
ao país novos produtos entre os quais óleo vegetal, feijão e sardinhas, com
o mesmo fim (RadioSolMansi, 03-06-2016).
Sem querer desvalorizar
o contributo destes donativos para o
bem-estar das crianças e das famílias, importa analisar esta questão também numa outra perspectiva (até porque
este papel deveria ser desempenhado pelas autoridades guineenses e não pelos
EUA). Num relatório secreto da CIA,
de Agosto de 1974, a cientista americana Susan
George, revelou que no futuro haveria falta de alimentos e que isso poderia
vir a dar aos EUA um Poder inimaginável.
O mesmo havia já sido referido alguns anos antes pelo senador americano Hubert Humphrey que, discursando sobre a
importância da ajuda alimentar,
dizia «e se pretendermos que eles cooperem
efectivamente connosco parece-me que a dependência
alimentar será uma arma formidável» (Santos, 2003: 29-34) – não há frase
mais clara que esta declaração do senador americano. Bem analisados o relatório
e o discurso, encontramos provas de
que há armadilhas por toda África e para
todos os africanos. São provas claras que nos levam a perceber como é que líderes [governantes ou intelectuais] africanos são manipulados, corrompidos,
denunciados, descartados, prejudicam o
povo e acabam por perder os seus bens que posteriormente são reconvertidos
como empréstimos para África. Estas são boas razões para a mudança de mentalidades, do discurso e dos procedimentos (Kosta,
2007: 467, 654; Mendes, 2010: 77-78).
Para colmatar estes défices é urgente reduzir
as ajudas externas e ter menos
intervenientes no processo de distribuição destas ajudas com maior controlo do destino dos apoios
concedidos.
Algumas ajudas acabam
muitas vezes por revelar-se muito
prejudiciais, se forem avaliadas a longo
prazo, porque têm implicações
que só se revelam posteriormente: uma ajuda nunca é só uma ajuda, implica a retribuição daquele que é ajudado, seja
de forma directa ou indirecta. Por estas razões os dois fenómenos – ajudas
internacionais e investimentos estrangeiros – devem ser repensados num quadro de capital social como “investimentos nas
relações entre os Estados com proveitos esperados no mercado” (Lin, 2001: 19
citado por Portugal, 2007: 15).
Seguindo a mesma linha de raciocínio da minha obra,
defendo que se a Guiné-Bissau quer escapar
dos efeitos negativos das ajudas internacionais e investimentos
estrangeiros, a sua política de cooperação
para o desenvolvimento do país deve deixar de centrar-se só no envio de
dinheiro, géneros e técnicos [ou tecnologias], que actuam de forma pontual, que
acabam por desaparecer e não oferecem
assistência nem manutenção. O objectivo desta cooperação deve passar a ser,
pelo contrário, a formação de técnicos
locais na agricultura e indústria; o incentivo ao desenvolvimento de universidades e pontos de investigação na
Guiné-Bissau, para que os guineenses possam criar as suas próprias tecnologias,
e formar os seus próprios técnicos. Nas palavras de Confúcio: “é mais importante ensinar a pescar do que
oferecer o peixe” (551 a.C. – 479 a.C.). E isto tem também o seu
enquadramento nas palavras de James Shikwati: “quando damos a esmola a um mendigo e voltamos a vê-lo na rua no
dia seguinte, não podemos dizer que o
ajudámos. Ele continua a mendigar […]. Precisamos de tirar o mendigo da rua
[…]. Temos de descobrir as potencialidades desse mendigo […], pois, isso sim estaremos
a melhorar a sua vida”. O que implica que a Guiné-Bissau necessita é de uma chance para ser capaz de administrar e
canalizar a sua própria riqueza. Mas isto não significa que a Guiné-Bissau
deve deixar de cooperar com outros Estados, bem pelo contrário, deve cooperar, mas de forma inteligente (Mendes, 2010: 93; Schelp, 10-08-2005).
Para
mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador – Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (pp. 191-192, 199-201, 464). Lisboa:
Chiado Editora.
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