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quinta-feira, 5 de maio de 2016

Manobras militares, o regresso de Obasanjo e uma solução para a crise na Guiné-Bissau

Caros leitores, no post de hoje retomo, na primeira parte, a questão das manobras de Miguel Trovoada e da presença das tropas dos EUA em África, em especial em Cabo Verde e no Senegal. Na segunda parte, recordo a Olusegun Obasanjo para ter cuidado com o que diz. Finalmente, na terceira parte, apresento uma possível solução para o fim desta crise política em que a Guiné-Bissau se encontra mergulhada.

   Primeira Parte: Tal como referi anteriormente, Miguel Trovoada parece ter conseguido “adormecer” as autoridades político-militares guineenses, aproveitando, com as suas “ajudas”, para instalar mais uma base nos Bijagós, reforçando as posições das NU e dos EUA na região (A Semana, 28-04-2016). A este respeito, recordo a importância de nos questionarmos: é a Guiné-Bissau que supervisiona as NU no seu território ou são as NU que têm controlo do território guineense?
Além disso, a realização de manobras militares conjuntas entre Cabo Verde e os EUA, em conjugação com a criação desta nova base (Sapo Notícias, 15-04-2016) devem alertar as forças armadas guineenses.  As tropas norte-americanas têm vindo a exercer influência ao longo dos últimos anos em África através de exercícios conjuntos e manobras em diversos países africanos (DW, 02-02-2016; RTP, 02-05-2016; Sapo Notícias, 15-04-2016).
Estas manobras  à margem do território guineense serão com certeza do agrado daqueles que defendem a transformação da Guiné-Bissau num protectorado das NU. Contudo, estamos a assistir paulatinamente a uma entrada dos EUA no continente africano, ocupando de forma mais ou menos discreta bases e posições de Poder que atravessam todo o continente. Depois de terem actuado em todo o Norte de África, deixando um rasto de destruição sem solução à vista, os EUA viraram o seu olhar mais para Sul, procurando obter lucros em zonas com grandes reservas de recursos naturais, e onde as fragilidades políticas permitem a sua penetração. Ou seja, estas fragilidades facilitam a entrada dos EUA e, simultaneamente, a sua entrada piora ainda mais as situações locais. Convém lembrar, porém, que ninguém tem acesso a um território sem a colaboração de elementos locais – no caso da Guiné-Bissau podemos contar com os quadros tanto da anglofonia como da francofonia, que se unem num interesse comum. Neste caso, Portugal/Lusofonia está a perder terreno, o que não é nada bom para a Guiné-Bissau. Esta atitude do Senegal, de Cabo Verde e dos EUA pode ser interpretada como uma antecipação da estratégia traçada no meu livro sobre a posição que a Guiné-Bissau deveria tomar perante o conflito de Casamança entre o Senegal e os Rebeldes Felupes/Djolas (Mendes, 2015: 466-473).
Segunda Parte: Olusegun Obasanjo, enviado especial da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental «CEDEAO» para a Guiné-Bissau, regressou há alguns dias a Bissau, para tentar resolver a crise política no país, conciliando as partes em conflito (Voz da América, 02-05-2016). O seu regresso parece um pouco contraditório face às últimas palavras que pronunciou antes da sua partida no mês de Fevereiro. Como se pode ouvir no vídeo, Obasanjo avisa o povo e os líderes guineenses, que a comunidade internacional já está saturada/cansada da instabilidade na Guiné-Bissau, tal como eu já tinha referido num post anterior. Cabe-me agora perguntar: se está tão cansado da Guiné-Bissau, porque regressou? Será que está à procura de um “tacho” junto de alguma organização internacional? No meu entender, a Guiné-Bissau é que tem razões para estar saturada, cansada e farta da presença de Obasanjo e de outros representantes do seu tipo, que em nada contribuem para o regresso da paz ao país (até parece que assustam a paz em vez de a fazer regressar!).

Terceira parte: Como eu já tinha escrito, Jomav, enquanto PR, tem como objectivo evitar tudo o que o ex-PM DSP quer, ou seja, evitar novas eleições enquanto DSP for presidente do PAIGC. Porque, no caso de se realizarem novas eleições, DSP será o candidato natural do PAIGC e sairá seguramente como vencedor para ser proposto como novo PM, enquanto Jomav terá a sua posição enfraquecida e os seus problemas serão agravados, tal como se verificou entre o ex-PR Nino Vieira e o ex-PM Carlos Domingos Gomes «Cadogo». Jomav, o PRS e os 15 Deputados retornados estão em consonância neste aspecto, pois sabiam que a decisão favorável aos 15 Deputados levaria inevitavelmente a um recuo de DSP, tal como Jomav recuou face à nomeação inconstitucional de Baciro Djá como PM (sendo obrigado a aceitar os condicionalismos de DSP e do PAIGC na nomeação de Carlos Correia como PM). No seu discurso, Jomav fez questão de mencionar este caso, deixando claro que as decisões dos tribunais devem ser acatadas categoricamente por todos. Posto isto, DSP não deve continuar a persistir na sua posição – é a sua vez de acatar as decisões do tribunal, recuando ao repor os 15 Deputados retornados pela sua decisão precipitada.
A solução mais viável, de acordo com o modelo político em vigor na Guiné-Bissau, seria a recolocação dos 15 Deputados retornados em cargos governativos, permitindo assim a reconciliação com eles. Nesta reformulação governativa, seriam retiradas 15 pessoas (entre Ministros e Secretários de Estado) que passariam a ocupar os lugares dos 15 Deputados retornados. Os outros 15 militantes entretanto escolhidos para ocupar os lugares dos 15 Deputados expulsos/retornados no Parlamento deveriam voltar aos seus cargos anteriores. Depois desta troca, seria importante ponderar a parceria com os outros partidos, de forma a maximizar os consensos. Se DSP quer mesmo sair vitorioso desta batalha, deveria seguir o caminho que o ex-PM Carlos Domingos Gomes Jr. «Cadogo» seguiu – ao ser demitido pelo ex-PR Nino Vieira (que entretanto nomeou mais três PM), retirou-se, ficando em silêncio no seio do partido-Estado PAIGC. Nas eleições legislativas seguintes, Cadogo candidatou-se e venceu, de modo que o PR não teve alternativa senão aceitá-lo. Se Cadogo tivesse causado perturbação (como DSP está a causar), teria sido forçado a renovar a confiança no seio do partido, correndo o risco de perder o seu lugar. E é precisamente isto que está a acontecer agora com DSP. Embora Cadogo não tenha nenhuma formação superior na área da Ciência Política (ao contrário de DSP), agiu como se tivesse conhecimentos sólidos nesta área. Neste sentido, de acordo com o impasse no Parlamentocabe ao PR Jomav a última palavra, tendo consciência da consequência da sua decisão.
Para terminar, deixo-vos com os ensinamentos de um grande clássico. Cícero afirmava que o orgulho e a teimosia são luxos que um líder não pode ter, reforçando que, se os líderes não tiverem um conhecimento profundo daquilo de que falam, os seus discursos não passarão de papagueamentos, e as suas acções serão perigosamente mal orientadas. Cícero escreve ainda que, em política, é irresponsável assumir uma postura inabalável quando as circunstâncias estão em constante mutação. Há alturas em que se justifica uma tomada de posição inflexível, mas recusar constantemente ceder é sinal de fraqueza, não de força (Cícero, 2013: 14-18).
Para mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador - Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (p. 466-473, 540). Lisboa: Chiado Editora.

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